Estamos vivenciando no decorrer das últimas décadas o conhecido 'Êxodo Rural', ou seja, o abandono do homem do campo em direção aos centros urbanos. No Brasil dados estatísticos aprovam que já temos mais de 80% da população vivendo na área urbana e uma das consequências e impactos é a diminuição de áreas verdes.
Há estudos técnicos que indicam que a falta de arborização nas cidades brasileiras sejam um dos motivos para a má qualidade de água, das terríveis tempestades e o stress das pessoas nos centros urbanos.
Podemos transformar a realidade de nossas cidades. O plantio de árvores é um ato de cidadania muito importante e contribui para melhorar nossa qualidade de vida , por isso é fundamental o planejamento da arborização urbana. O plantio realizado sem planejamento, com espécies não indicadas ao meio urbano, ou feito com técnica inadequada, pode acarretar em diversas situações de transtornos futuros ao cidadão, como casas com trincas, infiltrações, calçadas quebradas, ou até mesmo o comprometimento da saúde da árvore. (texto extraído da Cartilha de Arborização Urbana da Secretaria Municipal do Verde e Meio Ambiente da cidade de São Paulo, disponível para download aqui).

Desenho feito por uma criança da 4ª C para explicar a importância da arborização
Vamos focar esta parte do post para a gestão municipal, ou seja, todo complexo arbóreo de uma cidade, quer seja plantado ou natural, compõe em termos globais a sua área verde. Todavia, costuma-se excluir a arborização ao longo das vias públicas como integrante de sua área verde, por se considerar acessória e ter objetivos distintos, já que as áreas verdes são destinadas principalmente à recreação e ao lazer e aquela tem a finalidade estética, de ornamentação e sombreamento (José Afonso da Silva. Direito Urbanístico Brasileiro, 2. ed. São Paulo. Malheiros, 1997, p 247-248). Isto se deve também ao fato de que a legislação de uso e parcelamento do solo (Lei 6.766/79) obrigar aos loteamentos apenas a destinar uma área verde para praças, silenciando-se sobre arborização das ruas. Outros ainda afirmam que falta de permeabilidade em vista das calçadas, descaracteriza esta forma de arborização como área verde.
Realmente se analisarmos apenas pelas suas finalidades principais, são distintas, mas se analisarmos do ponto de vista ambiental, podemos concluir que as árvores existentes ao longo das vias públicas não podem ser excluídas dos complexo de áreas verdes da cidade, pois apesar de estarem dispostas de forma linear ou paralela, constituem-se muitas vezes em uma "massa verde contínua", propiciando praticamente os mesmos efeitos das áreas consideradas como verdes das praças e parques. Além do mais, normalmente estas árvores deverão ser protegidas pela legislação municipal contra cortes, de forma que sua localização acaba sendo perene, fortalecendo o entendimento de que compõem efetivamente a "massa verde urbana". Ademais, este tipo de arborização tem a finalidade de propiciar um equilíbrio ambiental entre as áreas construídas e o ambiente natural alterado. Para os gestores municipais e ambientalistas, a vegetação existente na cidade deve ser considerada como área verde, inclusive as árvores de porte que estão nos quintais, ou seja em áreas particulares. Não são áreas verdes do Município? Evidente que são, pois também estão sob fiscalização do Poder Público, por força do contexto jurídico atual que as protege. Resumindo, toda vegetação ou árvore isolada, quer seja ela pública ou particular, ou de qualquer forma de disposição que exista no Município, constitui a "massa verde urbana", por consequência a sua área verde.
De outro modo, há divergências até quanto a forma de se obter o índice área verde/habitante, pois alguns utilizam em seus cálculos somente as áreas públicas, enquanto outros toda a "massa verde" da cidade. No meu entender, deve-se considerar as áreas verdes particulares (quintais e jardins), que muitas vezes são visivelmente maiores que as públicas. Assim, quando falamos em áreas verdes, estamos englobando também as áreas onde houve processo de arborização público ou particular, sem exclusão.
Podemos observar que atualmente, as áreas verdes ou espaços verdes são essenciais a qualquer planejamento urbano, tanto que na carta de Atenas há recomendação para sua criação em bairros residenciais, bem como essas áreas devem ser definidas claramente que são para recreação, escolas, parques infantis, para jogos de adolescentes e outros, sempre para uso comunitário. Além de todas estas destinações citadas, as áreas verdes têm outras funções importantes tais como: higiênica, paisagística, estética, desvalorização da qualidade de vida local, de valorização econômica das propriedades ao entorno etc. Em termos de Direito Urbanístico o art. 22 da Lei 6.766/79 - Lei do Parcelamento do Solo - impõe para o registro de parcelamento a constituição e integração ao domínio público das vias de comunicação, praças e os espaços livres. Nestes últimos estão incluídas as áreas verdes. No art. 23 da citada lei, os espaços livres - entre eles as áreas verdes, como dito - passam a integrar o domínio público do MUNICÍPIO e em muitos deles as leis de parcelamento do solo determinam que nos projetos de loteamento sejam destinadas percentuais do imóvel a áreas verdes.
Deste modo, os espaços verdes ou áreas verdes, incluindo-se aí as árvores que ladeiam as vias públicas fruto da arborização urbana, também por serem seus acessórios que devem acompanhar o principal, são bens públicos de uso comum do povo, nos termos do art. 66 do Código Civil, estando à disposição da coletividade, o que implica na obrigação municipal de gestão, devendo o poder público local cuidar destes bens públicos de forma a manter a sua condição de utilização.
Podemos ver que a 'arborização' é essencial a qualquer planejamento urbano e tem funções importantíssimas como: propiciar sombra, purificar o ar, atrair aves, diminuir a poluição sonora, constituir fator estético e paisagístico, diminuir o impacto das chuvas, contribuir para o balanço hídrico, valorizar a qualidade de vida local, assim como economicamente as propriedades ao entorno. Além disso é fator educacional. Funções estas também presentes nos parques e praças. Ademais, por se constituírem em muitos casos em redutos de espécies da fauna e flora local, até com espécies ameaçadas de extinção, as árvores e áreas verdes urbanas tornam-se espaços territoriais importantíssimos em termos preservacionistas, o que aumenta ainda mais sua importância para a coletividade, agregando-se aí também o fator ecológico. Estas funções e características reforçam seu caráter de bem difuso, ou seja de todos, afinal o meio ambiente sadio é um direito de todo cidadão (art. 225, Constituição Federal).
Aliás, por se tratar de uma atividade de ordem pública imprescindível ao bem estar da população, nos termos dos arts. 30, VIII, 183 da Constituição Federal e o Estatuto da Cidade (Lei 10.257/01), cabe ao Poder Público Municipal em sua política de desenvolvimento urbano, entre outras atribuições, criar, preservar e proteger as áreas verdes da cidade, mediante leis específicas, bem como regulamentar o sistema de arborização. Disciplinar a poda das árvores e criar viveiros municipais de mudas, estão entre as providências específicas neste sentido, sem contar na importância de normas sobre o tema no plano diretor, por exemplo. Além disso, a legislação urbanística municipal pode e deve incentivar ao particular a conservação de áreas verdes em sua propriedade, assim como incentivar a sua criação e manutenção, possibilitando inclusive desconto no IPTU ao proprietário que constitui ou mantém áreas verdes no seu imóvel, como já ocorrem em algumas cidades, como Porto Alegre, Uberlandia. Deve-se lembrar e citar Hely Lopes Meirelles quando diz que entre as atribuições urbanísticas estão as composições estéticas e as paisagísticas do Município (Direito Municipal Brasileiro. Malheiros. 9ª edição. 1997, p382), nas quais se inclui perfeitamente a arborização.
É importante lembrar por sua vez, quem destrói ou danifica, lesa ou maltrata, por qualquer modo ou meio, plantas de ornamentação de logradouros públicos ou em propriedades privadas alheias, comete crime ambiental penalizado nos termo do art. 49, da Lei 9.605/98 - Lei de Crimes Ambientais.
Portanto, pela condição jurídica de bem comum do povo as áreas ve
rdes naturais ou arborizadas podem e devem ser protegidas legalmente pela coletividade através das associações de bairro por meio da ação civil pública (Lei 7.347/85), ou pelo Ministério Público, ou pelo cidadão através da ação popular (Lei 4.717/65). Afinal, por sua importância sócio-ambiental representam valores aos cidadãos, bem como às empresas que nada mais são do que a extensão de nossas atividades e consequentemente de nossos anseios e bem estar.
Obs.: Artigo publicado em A Tribuna de Santos/SP; Correio Braziliense - Direito & Justiça