domingo, 28 de dezembro de 2008

O prefeito e o LIXO ... E agora meu candidato?


É curioso que, apesar da gravidade da situação, o tema do lixo tenha freqüentado tão pouco as discussões durante a última campanha eleitoral nas grandes cidades brasileiras. Em Rio Grande, Pelotas e todas as cidades da região sul o assunto era evitado pelos candidatos a prefeito. Uma das poucas exceções é São Paulo, embora mesmo nesta o debate se tenha centrado na questão de ilegalidades apontadas na licitação para a coleta, e não na política de resíduos.
E, no entanto, a situação é preocupante. Mais de metade das cidades brasileiras continua mandando seus resíduos para lixões a céu aberto e só 11% têm aterros adequados. Segundo a última Pnad/IBGE, quase 15% dos domicílios não dispõem de coleta. Como as estatísticas dizem que produzimos diariamente 130 mil toneladas de lixo domiciliar e comercial, isso quer dizer que pelo menos 20 mil toneladas/dia não são sequer coletadas, dispersam-se pelas ruas e assoreiam rios, levadas pelo vento e pela chuva.

São Paulo, Rio e Belo Horizonte estão em situação crítica em matéria de aterros. A capital paulista tem pouco tempo para resolver o problema, antes que se esgote a capacidade de seus aterros para receber de 12 mil a 14 mil toneladas por dia. Curitiba, apontada como exemplar em limpeza urbana, por falta de solução está tendo de ampliar a capacidade tecnicamente já esgotada de seu aterro. Com riscos.

Mas não conseguimos avançar na formulação de uma política de resíduos sólidos. O Conselho Nacional do Meio Ambiente (Conama) continua a produzir resoluções que têm força de lei - mas não chegam à prática. É assim com os entulhos de construção, pneumáticos, resíduos de estabelecimentos de saúde, remédios, pilhas e baterias. Na verdade, nem sabemos direito quanto produzimos de cada um desses itens (a Europa, por exemplo, produz 14 quilos de lixo eletrônico por habitante/ano).

Já não se sabe também o que vai acontecer com o projeto de LEI DE POLÍTICA NACIONAL DE RESÍDUOS SÓLIDOS. Em 2000, dezenas de proposições nessa área que tramitavam pelo Congresso foram sistematizadas num projeto de política nacional pelo relator, o então deputado Emerson Kapaz. Tinha méritos o texto, principalmente a proposta de responsabilizar os geradores de embalagens pelo custo de sua destinação, além de tentar introduzir a coleta seletiva. Enfrentou, entretanto, cerrada oposição dos fabricantes de embalagens e essa responsabilidade caiu na segunda versão. Na verdade, caiu tudo, pois já não se sabe que destino terá o projeto, com o relator não reeleito em 2002 e com a indefinição quanto a essa matéria no governo federal.

Nesse quadro, é interessante ver o que está acontecendo em algumas partes do mundo nessa área de embalagens, principalmente de plásticos, pois hoje o mundo consome, segundo a revista New Scientist (11/9) nada menos que 1 milhão de sacos plásticos por minuto, o que significa quase 1,5 bilhão por dia e mais de 500 bilhões por ano. É um tipo de lixo que preocupa, porque, embora represente apenas 1% (em peso) dos resíduos que vão para aterros na Europa, é o que mais emporcalha as cidades e o campo, prejudica animais, entope a drenagem urbana, assoreia rios e contribui para inundações.

A indústria do setor não aceita essa visão. Diz que se trata de produto higiênico, sem odor, à prova de água, resistente, cômodo para carregar e que contribui pouco em volume para o lixo. Mas o cerco está se apertando. Um dos ângulos mais visíveis é o da luta de organizações que tentam proteger animais. A partir de 2002 elas intensificaram os ataques quando foram encontrados 800 quilos de plásticos no estômago de uma baleia morta na Normandia. Segundo essas organizações, a cada ano morrem assim dezenas de milhares de tartarugas, baleias, focas e pássaros. Outras apontam a descoberta de uma área de milhares de quilômetros quadrados, no fundo do Oceano Pacífico, coalhada de lixo, principalmente plástico.

Muitos países estabeleceram limitações. O primeiro foi a Dinamarca, em 1994, ao criar uma taxa sobre todas as embalagens - além de proibir outras, como as latas para cervejas e refrigerantes, plásticos e tetrapak para leite. O consumo de embalagens plásticas caiu 66%. A Alemanha criou o Green Dot, fundo para o qual produtoras de embalagens contribuem. Com alguns bilhões de euros por ano, o fundo encarrega-se da coleta do lixo "seco" (papel, papelão, plásticos, metais, vidros, etc.) em todo o país. Com isso se reduziu em 15% o lixo seco, em poucos anos. A Irlanda, em 2002, criou taxa, paga pelo consumidor, para o uso de sacos plásticos. O consumo caiu 90% e a arrecadação de mais de R$ 70 milhões anuais se destina ao custeio de projetos ambientais.

A ofensiva mais recente é na Ásia. Taiwan criou taxa por saco plástico e reduziu a circulação em 69%. Bangladesh, onde 10 milhões de sacos por dia eram jogados na rua, criou multa de mais de R$ 20 por unidade, para impedir que assoreiem rios e contribuam para inundações terríveis como as de 1988 e 1998 no Rio Buriganga, que atravessa a capital. Como resultado, ressurgiu a indústria de embalagens de juta, que, recicladas, se transformam em cadernos escolares. Infratores pagam multas de mais de R$ 30 mil e podem ser condenados a dez anos de prisão. Também o Estado de Himachal Pradesh, na Índia, pune com prisão (sete anos) e multa (R$ 3,5 mil) quem desrespeitar a lei que proibiu o uso de sacos plásticos. A China obriga supermercados a pagar taxa sobre sacos que forneçam. Na Austrália, várias cidades se declararam por lei "livres de sacos plásticos" (o consumo nacional era de 6 bilhões de unidades por ano).

É uma tendência mundial - responsabilizar o produtor e/ou consumidor/gerador de lixo. Cedo ou tarde teremos de chegar aí. O quadro de anomia em que vivemos nessa área é que não poderá continuar. Ou o de retrocesso, com a Receita Federal cancelando no atual governo a decisão, negociada pelo Ministério do Meio Ambiente na administração anterior, que isentava de tributos empresas que comprassem plásticos de cooperativas de catadores, para reciclá-los. É inacreditável.

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